quarta-feira, 25 de abril de 2007

Crescimento e maturidade

Fui politicamente instruído de forma célere e enquadrada. Na minha turma, em 74/75, dois colegas dominavam a matéria, centrando-se no trotskysmo, doutrina que reproduziam com entusiasmo e profundidade. Aprendi, rapidamente, a desprezar os revisionistas (o que era difícil, porque alguns eram bons amigos), a desconfiar dos maoistas (com quem simpatizava, pela forma empenhada da sua militância) e a odiar os estalinistas - que diabo, Trostky, herdeiro de Lenine, foi morto, no México, a mando de Staline, o usurpador!
Aprendi a conhecer a 4ª Internacional sem fazer ideia se houve outras, antes. Descobri que a social-democracia russa propunha uma visão comunista da sociedade e que a dominante na Europa nada tinha a ver com a de Francisco Sá Carneiro.

Para me libertar destas amarras ideológicas, aderi à FSP – uma espécie de alter ego do PS, menos intelectual que o MES, o partido da esquerda festiva. Manifestações, comícios, colagem de cartazes, reuniões e doutrinação passaram a ser actividades normais, do dia-a-dia. Namorar, também.
Recordo com carinho a mistura dos mundos. Ela trabalhava paredes-meias com a sede, eu fazia horas com panfletos e treino de guerrilha urbana. Às sete, ela despegava, eu transitava de um idealismo para outro. Não sei se a encontrei por força da causa, se aderi ao partido pela proximidade. Mas adorei todos os bocadinhos, com ela e com ele.
Fui parte activa no verão quente (1975). Ajudei, sistematicamente, a engrossar a participação popular. 20 de Setembro, 11 de Março, 25 de Novembro não são só datas. São acção, participação, gozo e frustração. Pires Veloso, Corvacho, Otelo e os 9, Vasco Gonçalves e Mário Soares não são só nomes. São referências, prós e contras, gritos e convicções.
É nosso costume avaliar o que fomos e o que fizemos, quando a maturidade nos atinge. Também o faço, com regularidade. Tive uma arma na mão, fui dado como gravemente ferido, assaltei uma sede e trouxe uma cadeira e um tapete de recordação. Disparos de G3, por cima da minha cabeça, acertando e marcando a parede a uns escassos metros do local onde me abaixei, também estão registados na minha mente. Explodiram cocktails molotovs aos meus pés e estufei o peito em direcção a contra-manifestantes. Tudo vivi com pleno e excepcional gosto. Tudo faria, de novo, se o tempo o permitisse e se as condições fossem similares. Não me vejo a fazê-lo, aqui e agora.




Mas não abusem, não prometam sempre um mundo novo, só por prometer.

É que pode querer o povo um mundo novo a sério.

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