quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Humores

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Se todos fossem iguais, o mundo era uma sensaboria (palavra que consegue dizer tudo o que queremos, mas só raras vezes encaixa – e consegue dar a entender outras coisas, pelo menos em termos sonoros).
Aceitar a diferença é um passo complicado, até porque nunca estamos no mesmo “comprimento de onda”; mas permite, quase sempre, o que mais se procura num relacionamento – a estabilidade.
Homens e mulheres podem ser diferentes, mas não são tanto quanto isso nem o são por causa disso (apenas). Muito do que somos está na formatação a que estamos sujeitos, enquanto vivemos. Sobretudo o que nos atinge depois de terminada a imaturidade (a boa, a esperada, a que se guarda mais no coração que na memória).
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Somos diferentes, aceitamos isso e, enquanto casais, não apontamos o dedo ao outro por existir – eis a fórmula perfeita.
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A quem pertence, genericamente, a constante mudança de humores, ora bem e feliz, ora triste ou ausente? A tentação primeira aponta, de imediato, para as mulheres. Mas, a ser assim, os homens seriam pessoas constantes na forma de ser e estar. Se é feliz um dia, é-o toda a vida; se amargurado o conhecemos, então …. Parece um pouco redutora, esta visão.
Então elas estarão mais predispostas a essas coisas e os homens não … pode ser, mas tenho sérias dúvidas. O que acontece, na minha opinião, é que temos, todos, elas tanto quanto eles, o mesmo sentir (em função do que nos faz o meio o outro ou, até, o que fazemos a nós próprios); somos diferentes, e muito, é na reacção, na forma como o demonstramos. Ou seja, ele está tão feliz quanto ela, mas nela nota-se mais (isto em termos gerais, é claro). Ela está na fossa, como ele, mas ele consegue, por mecanismos muito simples, passar a ideia que não foi afectado. Ela não consegue. Nunca consegue.
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O segredo dos relacionamentos estáveis (que todos procuram, por muito que o neguem, ninguém é indiferente a esse imperativo social) reside tanto na tentativa dela em “amenizar” as reacções quanto na compreensão da necessidade duma maior exposição de sentimentos, por parte dele.
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O que abala tudo isto é a dureza da vida. Se as coisas já foram vividas e não ultrapassadas, num passado mais ou menos recente, a tentação para a radicalização é enorme. Se ao outro (ele ou ela) já doeu demais, sem ter do par escolhido a resposta que esperava, não estará disponível para novo sofrimento, ainda que o escolhido esteja capaz de reagir (muitas vezes sem ter tempo, sequer, para o tentar fazer).
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Mas a vida não é só dor. Também as horas amargas dão lições, muitas vezes de filosofia, se usarmos o saber do poeta popular. E essas aprendizagens de vida dizem-nos, se escutarmos, que há duas componentes essenciais à estabilidade – o tempo e o som, a paciência e o diálogo, a serenidade da palavra. Sem arremessar, desde logo, projécteis demolidores. Ainda que apeteça.
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Quem disse que não há receitas? O que faltará é contemplação …
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