domingo, 15 de julho de 2007

Regresso às origens

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A minha família tem uma tradição que vai mantendo: todos os anos, pelo Julho adentro, faz um piquenique, onde se criam laços com a geração mais nova e se matam saudades dos mais velhos.
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A minha família, no encontro anual (seríamos, este ano, uns 40 e tal)
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Começou por ser no centro do país, em Mira, mas quando constatámos que o local era tão importante quanto as pessoas que aí se juntavam, virámo-nos para outra solução – regressar às origens.
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Este ano fizemo-lo em Celorico, à semelhança do ano passado. Numa das sete irmãs, na Senhora do Vizo, onde peregrinámos com regularidade na nossa infância e juventude.
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A capela da N. Sra. do Vizo, uma das 7 (ou 9?) irmãs
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Os meus novos amigos de Felgueiras falam nas nove irmãs, eu sempre ouvi dizer sete mas, verdade seja dita, só consigo nomear umas 6: Senhora da Graça, Senhora do Calvelo, Senhora do Vizo, Senhora da Penha, Santa Luzia e, desde que lá vou com regularidade, Santa Quitéria.
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A lenda diz que, num dia de absoluta claridade, de qualquer uma delas vemos as restantes. Já tentei umas largas dezenas de vezes e só consigo lobrigar 2 ou 3. Parece que dias absolutamente claros são raridades, se não impossibilidades, nos tempos que correm!
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Da N. Sra. do Vizo vê-se, com facilidade, a N. Sra. do Calvelo e a N. Sra. da Graça (convém aumentar - basta fazer um clique na imagem)
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Para partilha, tirei algumas fotografias, que exibo neste texto. Mas pretendo, também, partilhar uma memória que resiste, dessas peregrinações à Senhora do Vizo.
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Comecei a ir lá ao alto aquando dos meus 6, 7 anos. Era uma festa importante; a azáfama, nos preparos do dia anterior, era grande. O merendeiro era o centro das actividades. Assados no forno a lenha, apanha de fruta, compra de bolos e a feitura de pão de milho (a bola de carne salgada era uma coisa por demais!) ocupava-nos todo o tempo e até altas horas da noite.
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Às 4h00 da manhã, mais coisa menos coisa, levantávamo-nos e fazíamos os últimos preparativos. 4h30, 5h00 da manhã, saíamos em grupo, que rapidamente engrossava com os vizinhos e os que moravam pelo caminho a juntarem-se à caravana. Entre as 9h00 e as 10h00, chegávamos ao alto do Vizo, cada família procurando o seu espaço, a nossa sempre na encosta defronte à capela, para assistirmos à procissão sem precisarmos de sair do nosso canto. Outros, mais religiosos, seguiam os andores, poucos mas pesados e bem decorados, que davam uma volta ao monte antes de regressar ao local de saída, ou seja, a capela da N. Sra. do Vizo.
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Muitas e boas recordações inundam as minhas lembranças. Uma delas centra-se nos tendeiros, que se dispunham na vertente nascida na capela, uns com comes e bebes, outros com melões, melancias e meloas, outros ainda com brinquedos. Nós íamos comprar vinho e cerveja, para fazer uma receita (ou remessa, dependia de quem a classificava), que juntava açúcar ao vinho, mexido q.b., seguindo-se a cerveja virada com cuidado extremo. Esta bebida escorria pelas gargantas com a suavidade do néctar. Também comprávamos melão (era um peso que não compensava transportar).
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Mas o que evoco é uma situação particular e engraçada – para nós, que na encosta oposta assistíamos com curiosidade. Para o dono da tenda que vendia os melões seria pouco agradável … se visse o que acontecia.
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A encosta onde decorria a "fuga dos melões" era, à data, bem mais selvagem!
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Eram, normalmente, dois. Um estava munido de um saco de serapilheira e sentava-se no fundo da ladeira. O Outro dirigia-se ao tendeiro e pegava num melão, para o apreciar. Apertava os topos, a barriga e, quando o tendeiro olhava par outro cliente, deixava-o cair ao chão, pegando de imediato noutro, dessa forma parecendo que estava hesitante na escolha. Com um dos pés, rolava o melão caído para trás e para baixo, dirigindo o fruto para o parceiro, que o metia no saco. Continuando a apalpar e a largar no chão os melões, sempre que o tendeiro se distraía, em pouco tempo uma dúzia (ou mais!) estava devidamente acomodada no saco do colega do gamanço!
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Para não se notar muito, faziam o mesmo em mais um ou dois tendeiros. Quando tinham uma quantidade assinalável, colocavam-se num local adequado e faziam uma venda promocional de melão, a metade do custo face aos tendeiros. Claro que vendiam rapidamente os melões, pois todos já sabíamos da tramóia e esperávamos pelo momento oportuno para os comprar.
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Isto permitia que a festa terminasse de forma agradável e movimentada. Alguém ia dizer aos tendeiros o que tinha acontecido e seguia-se, invariavelmente, uma cena de pancadaria, com os paus a assobiar a cantiga da fanfonice dos vizinhos de Fafe, dispostos a não deixar que o jargão da cidade mais próxima fosse questionado – com Fafe ninguém fanfa!
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